Dias 27 e 28 de junho, no Sesc Palladium de Belo Horizonte, fui assistir às apresentações da Cia Brasileira de Ballet, sob a direção de Jorge Texeira.
A CBB é formada por bailarinos jovens, talentosos e muito técnicos. Pode-se dizer, acredito eu, que hoje a CBB é a segunda mais importante Cia de dança clássica do país.
De início, gostaria de parabenizar e ressaltar o excelente trabalho de Tadheo de Carvalho e Lorena Boaventura, professores e ensaiadores da Cia. É na dança do corpo de baile que vimos com mais clareza o trabalho dos ensaiadores, então, digo, com sinceridade e orgulho, que os dois fizeram um trabalho surpreendente e maravilhoso!
A CBB não se fixou em nenhuma versão já remontada da obra. Ela se baseou em várias, seguindo delas o que achava melhor. Isso demonstra o trabalho com estudo e pesquisa feito pelo diretor Texeira, e pelo coreógrafo Henrique Talmah. Qualidades essências, a meu ver, para a criação de qualquer obra, seja ela uma remontagem histórica ou um novo espetáculo.
Nos dois dias de espetáculo na capital mineira, vi solistas completamente diferentes uns dos outros, mas da mesma forma, fiel ao personagem interpretado. Giselle é um ballet muito complexo e cheio de nuances, por isso, podem existir várias formas diferentes de interpretação do mesmo momento.
No primeiro dia, Giselle, interpretada por Luciana David, tinha um temperamento mais forte, era a camponesa que sabia exatamente o que quer. Hilarion, vivido por Johnny Almeida, me lembrou a mesma ideia vista por Mats Ek na sua remontagem contemporânea, ou seja, um jovem completamente apaixonado, que não conseguia entender o que passava na cabeça de sua amada, e muito menos suas ações, por isso, por vezes, pareceu agressivo com ela. Tudo justificável pelo libreto. Já Albrecht, na interpretação de Gustavo Carvalho, um jovem realmente apaixonado e doce. O seu comprometimento com Bathilda aparentou mera obrigação, mas os seus sentimentos pertenciam à jovem camponesa. Myrtha, Joyce Liziane, foi uma rainha autoritária, onde nada acontecia sem o seu aval ou ordem.
No segundo dia, Melissa de Oliveira elevou a doçura de sua personagem, Giselle. Hilarion foi um cavalheiro perante as encruzilhadas de seu destino. Albrecht, na interpretação de Mozart Mizuyama, representou um duque, amante de Giselle, sempre ciente que estava enganando a pobre camponesa, e aparentou até um divertimento com tal situação. Já Myrtha, Lis Sayão, foi bem menos autoritária, dando mais espaços para a projeção de todas as outras Wilis.
Quero dizer que fiquei muito orgulhosa, como brasileira, de ver o trabalho desta jovem companhia. Jovem, não pela sua história, mas pelo seu elenco. É muito bom ver uma cia brasileira de dança clássica crescer e se projetar para o cenário mundial. Quero ver a CBB respeitada no mundo como uma grande Cia. Por isso, sinto-me a vontade para fazer algumas críticas que espero ser compreendida como positivas, pois esta é a minha intenção.
Quero chamar a atenção dos bailarinos para um fato: As pantomimas são o ballet. Principalmente nos ballets do período romântico. As danças fazem parte do preenchimento estético e alegórico, mas as pantomimas, estas sim, são o Ballet, e não podem ser passadas sem ênfases. Os ensaiadores deram ênfase nas pantomimas, mas os bailarinos, durante as duas apresentações que tive a felicidade de assistir, por serem muito jovens, passaram por elas como parte da coreografia, quando na verdade, são elas que justificam a razão de ser das coreografias.
Essa ênfase no elemento movedor do enredo engrandece o intérprete, a companhia e o espetáculo. Ela dá o suporte emocional para que os bailarinos interpretem todas as danças, soladas ou de grupos.
Continuando a falar sobre ênfases (e a falta delas), existiram momentos onde, devido ao vigor físico, na vontade de elevar um pouco mais a perna, fazer um salto um pouco mais alto, girar uma pirouette a mais ou ficar um pouco mais no equilíbrio, os acentos musicais não foram trabalhados corretamente. Assim a interpretação vai dando lugar à execução, pois o bailarino, na minha opinião, não pode “dançar” a música, ele deve “ser” a música. Por isso a utilização de leitmotifs (inclusive, Giselle foi o primeiro ballet a usar desta valiosa ideia, que já vinha sendo utilizada nas óperas).
O último ponto sobre o qual gostaria de falar é sobre o figurino de Bathilde. O vestido é maravilhoso! Lindo! Rico! Mas, penso que mais apropriado para uma nobre vestir em um baile do que para acompanhar uma comitiva na caça.
Fora isso, os figurinos estavam como devem ser: bonitos, bem feitos, de acordo com cada personagem, que chamam a atenção, mas não mais do que quem o veste.
Queria, mais uma vez, ressaltar o excelente trabalho de Lorena Boaventura e Tadheo de Carvalho, os ensaiadores. E parabenizar a todos! Principalmente Jorge Texeira, maior responsável pelo grande espetáculo que tive a felicidade de assistir.
Agradeço a todos, não só pelo que vi, mas pelo que vocês começam a representar. Representar do Brasil para o mundo. Torço pelo sucesso e crescimento profissional da CBB e seus bailarinos. Temos Cias de teatro e dança contemporânea, que já conseguiram esse respeito e reconhecimento internacional. Temos bailarinos clássicos dispersos pelo mundo, que também conseguiram o que mereciam. Falta agora uma Cia de ballet clássico.