Na quarta-feira da semana passada, dia 26 de Novembro de 2014, a Roda de Capoeira foi considerada Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. O título é conferido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO). A votação ocorreu durante a 9ª sessão do Comitê Intergovernamental para a Salvaguarda do Patrimônio Imaterial. A reunião da UNESCO aconteceu entre os dias 24 e 28/11, na sede da Organização, em Paris.
O título é conferido a expressões de vida e tradições que ancestrais passam para seus descendentes, de todas as partes do mundo. A comunidade internacional adotou a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial em 2003 e, deste então, outras quatro tradições brasileiras já foram agraciadas. A Arte Kusiwa — técnica de pintura e arte gráfica própria da população indígena Wajãpi, do Amapá, recebeu o título em 2003. O Samba de Roda do Recôncavo Baiano (BA) em 2005, o Frevo (PE) em 2012 e o Círio de Nazaré (PA), que teve a inscrição feita no início de Dezembro do ano passado e recebeu o título, oficialmente, no primeiro dia da procissão deste ano, em 7 de Outubro de 2014.
A Roda de Capoeira é uma das manifestações culturais brasileiras mais conhecidas e praticadas no mundo. A prática afro-brasileira é um mistura de arte marcial, esporte, dança, música e acrobacia. Segundo informações do próprio Ministério da Cultura, a Capoeira é praticada em mais de 160 países dos cinco continentes.
A origem da Capoeira e da sua Etimologia é termo de discordância entre vários historiadores. O que se sabe é que os primeiros registros da prática começaram a aparecer em Salvador, Rio de Janeiro e Recife no Séc. XVIII, mas acredita-se que a prática vem desde o século XVII.
A história que mais conhecemos é a de que a capoeira surgiu em meio às humilhações, maus tratos, violência e condições desumanas às quais os escravos eram submetidos. A prática era uma forma de treino para o combate, uma esperança de liberdade e sobrevivência.
Para disfarçar o treinamento de uma arte marcial, a capoeira foi desenvolvida como uma falsa dança. Os praticantes a faziam dentro de uma roda onde os seus companheiros cantavam e batiam palmas. Os golpes e “esquivas” (movimentos de fuga de golpes) aconteciam entre movimentos dessa “falsa dança”, que seria o início do que hoje é chamado de ginga. Esse movimento, se o analisarmos, é uma estratégia de combate, pois não oferece ao oponente um alvo fixo.
Em 1482, Portugal começa a invadir o que hoje é Angola. Já naquela época, existia uma tradição entre os pastores do sul, que celebravam a iniciação das jovens à vida adulta em uma cerimônia, um tipo de “festa de debutante”. Dentro dessa cerimônia, os homens disputavam uma competição ao som de atabaques. O objetivo do “jogo” era conseguir encostar o pé na cabeça do adversário, ganhava quem o fizesse. Como prêmio, o vencedor tinha o direito de escolher uma noiva entre as que estavam sendo iniciadas à vida adulta, sem ter que pagar o dote.
Esta tradição, ou modalidade de luta, foi exportada para o Brasil junto com os escravos. Durante o império, em alguns locais, a população se referia ao jogo de Capoeira como “brincar ou jogar de Angola”.
Uma das teorias existentes sobre o surgimento da palavra Capoeira, afirma que ela vem do Tupi Kapu’era. Ka’a significa mata, e pûera – que foi, portanto, “o que foi mata”. Ou seja, os locais de vegetação rasteira onde supostamente os escravos se encontravam para a prática da capoeira. Esses locais eram utilizados pelos índios para a agricultura e normalmente se encontravam ao redor das grandes fazendas de cana-de-açúcar, principal atividade econômica da colônia na época.
Devido à enorme quantidade de fuga de escravos, da dificuldade em capturá-los e da força quase militar que a Capoeira adquiriu nos Quilombos (assentamentos dos escravos foragidos e outros povos e pessoas que fugiam da repressão colonial), na portaria de 31 de Outubro de 1821, o governo estabeleceu castigos corporais severos e outras medidas de repressão à prática da capoeira.
Em 13 de Maio de 1888, o parlamento sancionou a lei Áurea, que foi assinada pela Princesa Isabel. A lei aboliu a escravidão no país, com isso, os negros foram abandonados à própria sorte, sem trabalho, moradia e com o desprezo da sociedade. Logo, grande parte dos negros foi marginalizada, e com eles a capoeira. Inevitavelmente, alguns começaram a fazer uso da técnica em trabalhos como guarda-costas, capangas, mercenários e assassinos de aluguel.
A então capital da república, o Rio de Janeiro, era atemorizada por grupos de capoeiristas conhecidos como Maltas. Em 1890, a República Brasileira, por Decreto, associou a Capoeira ao primeiro crime do Código Penal Brasileiro (com pena que poderia levar de dois a seis meses de reclusão), proibindo e criminalizando a sua prática. Essa proibição só foi totalmente revogada em 1940, quando a palavra capoeira foi retirada do Código Penal Brasileiro.
Em 1932, Mestre Bimba fundou em Salvador a primeira academia de Capoeira da história. Ele desenvolveu um dos primeiros métodos sistematizados de treinamento, chamando-o de Luta Regional Baiana (já que a capoeira ainda era proibida), um estilo de capoeira com maior foco no marcial.
A Capoeira Angola é o estilo mais tradicional da Capoeira. Envolve a malícia, a malandragem, a imprevisibilidade, com características de dissimulação, brincadeiras e até de teatralização, todo o necessário para vencer seu oponente.
Vídeo: “Paz no mundo Camará: a Capoeira Angola e a volta que o mundo dá”, de Carem Abreu.
Fontes: Sites do Ministério da Cultura, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Wikipedia, Revista de História da Biblioteca Nacional, site do Governo de Angola e trabalho de Ferreira, B.S.: “Imagens da capoeira do século XIX”, de onde foram tiradas todas as imagens.