Com certeza você já ouviu muito nas aulas de dança que para ficar boa é preciso repetir milhões de vezes o mesmo exercício ou movimento. Mas, qual é o limite da repetição? Realmente aprendemos rápido? E até que ponto é saudável começar uma aula com 12 pliés/grand pliés?
Tenho refletido bastante sobre mudanças corporais no mundo atual e a forma com que o ser humano lida com o corpo no dia a dia.
São horas sentado em frente ao computador ou no celular, sentado no trabalho, sentado na escola, sentado estudando, sentado se deslocando para algum lugar, sentado conversando com amigos e familiares. Ou seja: horas sentado. E desde quando fomos feitos para passarmos tanto tempo assim?
Na verdade, fomos feitos para agirmos ao contrário disso: para andar, correr, pular, etc.
Não é à toa que meu fisioterapeuta sempre fala: passou 8h trabalhando sentada, redigindo textos, e quer começar a aula de dança com vários movimentos repetitivos e intensos. Ele tem razão. É preciso calma!
Atualmente, cresce o aumento da limitação do indivíduo no espaço, impactando em sua movimentação. Porém, em contraponto ao estilo de vida contemporâneo, vêm surgindo discussões sobre resgate da movimentação natural e de saúde do corpo e, claro, a dança pode se beneficiar disso.
Em muitas aulas de dança, como as de balé clássico, existe a repetição exagerada de exercícios, a fim de alcançar a perfeição de movimentos. E, levando-se em conta a rotina vivida pela maioria das pessoas (longo período de inatividade e/ou atividades repetidas), a ocorrência de machucados pode ser facilitada, devido à sobrecarga no corpo.
Que tal, então, trabalhar ao contrário e promover variações? Existem diversas maneiras de estimular o corpo para chegar a determinado movimento ou desempenho, como, por exemplo, a pirueta. Teria mesmo necessidade de fazer repetidamente ou é possível aprender de forma mais rápida e efetiva através de versões diferentes do movimento? Para alguns cientistas é possível sim e esta abordagem foca em desenvolver novas habilidades motoras.
Variar a movimentação, além de gerar mais versatilidade e rapidez na percepção da ação, ainda pode auxiliar a autodescoberta corporal, uma vez que o indivíduo começará a entender que é único, ao invés de forçá-lo a fazer determinado movimento padrão (sem levar em conta que cada corpo é um corpo).
Por isso as variações são importantes, pois incentivam cada um a pensar de maneira pessoal.
De acordo com Débora Pereira Bolsanello, autora do livro Educação Somática, é fundamental criar estímulos aos alunos a fim de desenvolver a sensação corporal, a percepção de movimentação e a intenção de cada ação, dando a liberdade para mover-se. De fato, sem essa lógica de individualidade e singularidade, também destacada pela autora e muito reforçada aqui no blog, o aluno se torna um copiador de exercícios e não um dançarino consciente e independente.
A ideia não é desconstruir movimentos da dança nem dar a entender de que são errados, mas refletir sobre o método de se chegar até eles. O foco é promover exercícios com modelos e estímulos diferentes aos alunos, a fim de aprimorar a percepção da individualidade e a movimentação saudável do corpo.
Os benefícios podem ser enormes. Para a dança, o importante é libertar e diversificar o corpo no espaço. Então, varie. Procure diferentes meios de alcançar o fortalecimento, o equilíbrio, a estabilidade e a flexibilidade. Não se prenda. Torne seu corpo versátil, ele foi feito para isso. Deixe que ele volte a se movimentar de maneira natural.
Com isso em mente, com certeza seu corpo também estará mais preparado para imprevistos, surpresas e dinâmicas corporais.
Foque na variação!
Um exemplo: para realização de fouettes, o fortalecimento nos braços e, principalmente, abaixo das axilas, é essencial. Ao invés de ficar horas com o braço estabilizado na lateral durante a barra, por que não promover diferentes estímulos de força? Se pendurar é uma boa maneira de fortalecer os músculos dos ombros e escápulas.
Texto originalmente publicado no blog Bem Dança