Amor, amor, amor. Mil vezes amor.
Um sentimento. Apenas um. Mas com efeito devastador. O mundo se transforma, vira deliciosamente de cabeça para baixo, deixa a gente com gagueira, cara de boba, rindo do nada e para nada, faz a vida ganhar novas cores, o sol aparecer em um céu cinzento, dá vontade de sair cantando e dançando no meio da rua, acelera o coração, as mãos suam, tremem, a emoção fica a ponto de transbordar e é justamente assim que sobrevive e sobreviverá sempre.
Tema de autores, cantores, poetas, compositores, artistas, pintores, escultores e músicos que sempre cantaram o amor nas mais diversas formas, por sua própria natureza encantada, o ballet clássico não poderia deixar também de construir uma bela história amorosa ao longo dos séculos. Uma história interpretada às vezes por personagens reais que levaram a emoção da dança para dentro de seus próprios corações.
Para celebrar o dia do amor e dos namorados, aqui estão lindas histórias vividas no palco e fora dele. Leiam, aproveitem, vivam cada minuto, deixem a emoção falar mais alto. Assim como fizeram Marcia Haydée e Richard Gragun, Marianela Nunez e Thiago Soares, Margot Fonteyn e Rudolf Nureyev, Leslie Browne e Mikhail Baryshnikov. Todos eles muito especiais, talentosos demais e perdidamente apaixonados. Não importa se na ficção ou na chamada vida real. Importante mesmo é que todos viveram com intensidade a plenitude do amor. Se foram felizes para sempre ninguém sabe. Mas que o sentimento foi infinito enquanto durou como sabiamente dizia o poeta Vinícius de Moraes em um de seus sonetos mais famosos, disso não temos dúvida.
FEITOS UM PARA O OUTRO
Em 1969, a brasileira Marcia Haydée – que se tornou uma estrela internacional desde cedo – durante a montagem de Opus 1 com o Sttutgart Ballet, conheceu Richard Gragun, bailarino americano formado por tradicional escola inglesa, na época, de passagem pela Alemanha.
E assim nasceu um lindo caso de amor que durou dezesseis anos. Cragun (que chegou a dirigir o Corpo de Baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro) e Marcia provaram que foram feitos um para o outro. Dançaram juntos durante trinta e seis anos em performances inesquecíveis, tais como Romeu& Julieta, Eugene Oneguim e A megera domada, espetáculos que até hoje são referências de perfeição e talento.
Considerada a “Maria Callas da dança”, em 1976 ela assumiu a direção do Sttutgart Ballet. Alguns anos depois, o casamento chegou ao fim. Entretanto, mesmo separados, ambos continuaram muito amigos. Ele criou uma Carabosse inesquecível para a montagem de A Bela Adormecida produzida por ela. Além disso, em 1990, quando o corpo de baile alemão encenou On Your Toes, Cragun pode realizar seu sonho de infância interpretando números de sapateado.
“Se fiz uma carreira da forma como aconteceu, foi por ter estado tanto tempo ao lado dele. Richard – um dos melhores bailarinos do mundo, do nível de Nureyev – teve uma imensa importância artística. Quando começou em Sttutgart, era coreógrafo e empurrou os bailarinos para um protagonismo até então inexistente. Eles deixaram de ser meros coadjuvantes das bailarinas. Sempre fomos muito próximos. Podia ligar para ele a qualquer hora”, declarou Marcia Haydée em agosto de 2012, quando Cragun faleceu, vítima de problemas respiratórios, em um hospital no Rio de Janeiro.
ERA UMA VEZ.…
Outro brasileiro que levou o amor do palco para a vida foi Thiago Soares, primeiro bailarino do Royal Ballet de Londres, que desde 2011 é casado com a argentina Marianela Nunez. Ter Marianela, que ocupa o mesmo posto que ele à frente do corpo de baile feminino, tão perto, é para ele “uma troca imensa em todos os sentidos”. “É maravilhoso saber que a mulher amada está ao nosso lado, ajudando a crescer e dividindo a rotina”, diz Thiago.
E a tal rotina não é de brincadeira. Thiago e Marianela trabalham diariamente de 9h à meia-noite. Em média são três espetáculos por semana, o que exige muitas aulas e ensaios. Mas o casal faz questão de se divertir distante dos refletores e das intermináveis horas de grands-jetés, fouettés, arabesques e souplesses, frequentando galerias de arte e espetáculos, mas sempre buscando tudo aquilo que possa servir de inspiração. Thiago confessa que leva as emoções para o palco. “Da sensibilidade à raiva. Gosto de usar todos os elementos do cotidiano na dança.”
Thiago e Marianela começaram a namorar de repente, durante um espetáculo de gala em Miami. Em um determinado momento mágico, como acontece mesmo nos contos de fadas, olhares se cruzaram mais demoradamente e pronto, o mundo da dança ganhava mais um casal apaixonado. O romance teve pedido oficial ao término de A Bela Adormecida, espetáculo protagonizado por ambos. Thiago surpreendeu Marianela com um anel, em cena aberta e na frente de um teatro lotado. É ou não uma história encantada?
OS MELHOES DO MUNDO
Margot Fonteyn e Rudolf Nureyev – os maiores, melhores e mais famosos bailarinos de todos os tempos — não experimentaram o amor fora de cena. Mas sempre foram tão perfeitos, dançavam em tamanha sintonia que pareciam mesmo um inesquecível par romântico em todos os sentidos.
Em 1931, Margot entrou para a escola do Sadler´s Wells e logo se destacou pelas excepcionais qualidades líricas, dramáticas e musicais, por proporções físicas perfeitas e – claro – por um talento indescritível. Em 1935, com apenas dezesseis anos, tornou-se a primeira bailarina a dançar com Robert Helpmann. Em A Bela Adormecida (esse ballet tem algum segredo, não é possível. Cupido deve ter passado por lá em algum momento. É coincidência demais!) Margot interpretou a princesa Aurora, conduzindo o futuro Royal Ballet a uma primeira temporada arrebatadora em Nova York.
Em 1961, depois da visita da companhia a Rússia, Fonteyn começou a dançar com o então exilado soviético Rudolf Nureyev, vinte anos mais moço que ela, diferença que desaparecia completamente aos primeiros acordes da orquestra. Quando dançavam juntos, dava para sentir de longe a “eletricidade” que havia entre eles. Era um só corpo e uma só alma. E foram muitas, muitas vezes que deram este imenso privilégio ao público. Romeu & Julieta, O Lado dos Cisnes, Giselle… todos os grandes clássicos passaram por aqueles pés capazes de tudo, até de voar. Eram vistos como o casal mais perfeito e excitante de que já se teve notícia no mundo. Foram idolatrados, ovacionados e reverenciados por todos, até ela se aposentar em 1979.
Aos que chegaram a levantar a possibilidade de um verdadeiro caso de amor entre eles, Margot fazia questão de dizer “Romances são ótimos. Mas minha paixão está na dança que representa tudo para mim: passado, presente e futuro. Como se fosse uma religião!”.
Antes de morrer, em 1991, Margot Fonteyn foi homenageada, junto com Rudy, como a grande dama do ballet do século XX. Em seis de janeiro de 1993, Rudolf Nureyev, também morria em Paris, aos 54 anos, de complicações cardíacas causadas pela AIDS.
UM MOMENTO QUE FICOU PARA SEMPRE
No filme The turning point (Momento de Decisão), eles formaram um delicioso par romântico. Mikhail Baryshnikov (Yuri) e Leslie Browne (Emília) viveram um conturbado caso de amor, dançaram divinamente, apaixonadamente e entraram para a história do cinema com seus personagens que falaram diretamente ao coração de milhares de espectadores arrebatados pela beleza do filme que mereceu várias indicações ao Oscar de 1977.
Nascido em Latvian, Rússia, Baryshnikov começou a carreira aos 15 anos e logo virou solista do Kirov Ballet, de Leningrado. Durante a tournée do grupo no Canadá, ele fugiu, reaparecendo depois nos Estados Unidos solicitando asilo político. Foi primeiro bailarino e diretor do American Ballet, mudando depois para o George Balanchine’s New York City Ballet. The turning point marca seu primeiro grande sucesso no cinema. Hollywood, aliás, nunca foi um problema para ele que assumiu com a maior tranquilidade o estilo de vida americano. Baryshnikov – um dos três maiores nomes da dança ao lado de Nijinski e Nureyev – continua a dançar e a coreografar, apesar de problemas nas articulações. E podem estar certos que ainda impressiona – e muito — pelo talento insuperável.
Na época, o papel da jovem interpretada por Leslie foi oferecido a Gelsey Kirkiland, então namorada de Misha, que acabou recusando, atitude que rendeu a Leslie, então bailarina contratada do ABT, a chance de expandir as fronteiras da sua arte.
.….….….….….….….….….….….….….
Ah… se por acaso você estiver sem namorado, nada de tristeza, cara feia ou desânimo. Chute tudo isso para o alto e siga adiante. Afinal o amor não “marca hora nem lugar”. E pode estar agora mesmo pertinho de você, ali, bem ao lado.
Basta olhar para ver. Mas tem que olhar com o coração.
Sejam todas muito felizes!